Há forte componente sentimental, mas também importante vertente racional
Quando o Brasil convidou Portugal a associar-se às comemorações do bicentenário da Independência, Portugal aceitou, sem qualquer hesitação.
Na equação desta nossa decisão houve um forte componente sentimental, há que reconhecê-lo. Mas houve também uma vertente racional muito importante.
No plano dos sentimentos, sabemos que há uma ligação fortemente enraizada no passado, mas que está igualmente alicerçada no dia a dia de tantos portugueses que, de algum modo, mantêm conexões com o Brasil. Seja por familiares, colegas e amigos brasileiros. Seja por negócios ou intercâmbios universitários.
Ou simplesmente porque gostam da música, do cinema, da literatura, do futebol, da gastronomia. A verdade é que, em cada canto de Portugal, esta influência respira-se e enriquece-nos.
Assim, é natural que, no que toca ao Brasil, Portugal não pestaneje. E que, nos momentos importantes, compareça. A presença no Brasil de sua excelência o presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, no culminar das celebrações, no 7 de Setembro, é reflexo disso mesmo.
Ainda assim, na condução da política externa, há que racionalizar o sentimento, de forma a pensar se determinada atuação faz ou não sentido à luz dos interesses e dos valores de Portugal —por mais que nos ligue um coração, mesmo que seja o do monarca, que foi primeiro do Brasil e só depois de Portugal.
Ora, também no plano da razão, a avaliação feita sobre a associação de Portugal às celebrações do bicentenário da Independência foi óbvia.
Primeiro, porque fazia todo o sentido aproveitar a oportunidade para, juntamente com as entidades brasileiras, criar momentos de união e franqueza em torno do significado da Independência e de confrontar ideias e visões sobre a presença portuguesa no Brasil, num diálogo saudável e atual.
Depois, porque se justificava complementar, de forma mais estruturada, o conhecimento acerca de Portugal no Brasil. Isto é, era importante dar a conhecer mais e melhor o país atual, nas suas vertentes cultural, econômica e social, desmitificando algumas percepções sobre a nossa nação, por puro desconhecimento.
Ao mesmo tempo, houve também a noção de que a relação bilateral entre Portugal e o Brasil, que é umbilical, deve ser constantemente atualizada para que faça sentido para ambos os lados e sirva a interesses mútuos. Ora, esta efeméride permite-nos falar do passado e alicerçar as bases futuras de forma descomplexada.
A experiência, até aqui, tem-nos permitido constatar que estávamos certos e que fizemos bem em ouvir o coração e a razão, pois a colaboração entre as autoridades brasileiras e as portuguesas tem sido exemplar e tem dado bons frutos.
De resto, não seria de esperar outra coisa, se se atentar ao profissionalismo, dedicação e visão dos coordenadores nacionais designados para as comemorações: o embaixador Francisco Ribeiro Telles, por Portugal, e o embaixador George Prata, pelo Brasil.
Gostaria aqui de destacar um momento que considerei particularmente importante: a realização da Bienal Internacional do Livro de São Paulo, em que Portugal foi o país convidado.
Fala-se hoje mais de Portugal no Brasil do que noutros tempos. Assim como se fala do Brasil em Portugal. Tal se deve, em muito, às celebrações do bicentenário, que nos ajudaram a reinventar esta relação bilateral, que vai sempre para além da conjuntura.
Da nossa parte, faremos o necessário para manter esta boa dinâmica, desde logo na perspetiva da próxima Cimeira bilateral, que queremos realizar em 2023, em Portugal.
info.folha.